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Desastres socioambientais: qual o preço do desenvolvimento?

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Rompimento de barragem de rejeitos de mineração destruiu parte de Brumadinho MG), em janeiro de 2019

14 min de leitura

Oferecido por

por Cinthia Leone*

 

Todos os países do mundo têm direito ao desenvolvimento econômico. Por meio dele é possível elevar a qualidade de vida da população, estabilizando tensões sociais e políticas. Mas sem a aplicação de leis ambientais e uma fiscalização eficiente por parte dos governos, o desenvolvimento pode cobrar um preço alto em vidas humanas e biodiversidade. 


Entenda os detalhes de algumas das principais tragédias ambientais causadas por atividades econômicas em todo o mundo. 

 

 

Rompimento da Barragem da Vale em Brumadinho (MG), Brasil

Setor econômico: mineração

 

Data: 25/01/2019 


Vítimas: 270 vidas humanas perdidas


O que ocorreu: 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro desceram numa avalanche de lama que chegou a atingir 70 km por hora e destruiu tudo pela frente. 

 

Desdobramentos: Além das vidas humanas perdidas, o colapso da barragem levou a um comprometimento sem precedentes dos cursos d’água da região, impactando mananciais que abasteciam a capital Belo Horizonte. Dos 270 mortos, apenas 259 corpos foram recuperados. O evento foi classificado como o maior acidente de trabalho ampliado da história do país. Além da Vale, os familiares de uma das vítimas e o próprio município de Brumadinho também processam, na Alemanha, a empresa Tüv Süd, que emitiu laudos fraudulentos atestando a segurança da barragem. 


As negociações para uma tentativa de acordo entre a Vale e o governo de Minas Gerais foram encerradas em 21 de janeiro, sem sucesso. Com isso, um processo em que o governo estadual e outras autoridades pedem reparação à companhia voltará a tramitar na primeira instância a partir do início de fevereiro. As vítimas ainda lutam na justiça por reparação, e acusam a Vale de usar seu poder econômico e aparato jurídico técnico para promover a morosidade do processo. 

 


Rompimento da Barragem da Samarco em Mariana (MG), Brasil

Setor econômico: mineração

 

Data: 5/11/2015


Vítimas: 19 vidas humanas perdidas


O que ocorreu: uma barragem da mineradora Samarco – controlada pela Vale e a BHP Billiton — entrou em colapso, despejando toneladas de rejeitos de minério e destruindo a pequena comunidade rural de Bento Rodrigues

 

Desdobramentos: toda a bacia do Rio Doce foi contaminada pela lama tóxica, incluindo a foz no litoral do Espírito Santo, tornando o desastre um dos maiores crimes ambientais do planeta e o maior do Brasil. Os atingidos ainda não tiveram reparados seus direitos violados. De acordo com o Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), até agora, as famílias atingidas não foram adequadamente reassentadas e foi constatado um aumento no número de casos de depressão, além de doenças respiratórias e de pele. 

 

Em outubro de 2020, procuradores acusaram a Vale e a empresa BHP de agirem em conluio com advogados para reduzir os valores de indenização. As empresas também foram acusadas de tentar interferir no processo contra a BHP que corre na justiça britânica. 

 

 

O crime ambiental da BHP na mina de OK Tedi, em Papua Nova Guiné

Setor econômico: mineração

 

Data: de 1984 a 2013 


Vítimas: 50 mil pessoas contaminadas


O que ocorreu: despejo contínuo do que se estima ter sido 2 bilhões de toneladas de rejeitos não tratados de mineração diretamente no leito dos rios OK Tedi e Fly.

 

Desdobramentos: Embora esteja envolvida no maior desastre ambiental do Brasil, o maior crime ambiental cometido pela empresa britânica BHP (e um dos mais graves da história) é o da mina OK Tedi, em Papua Nova Guiné. Em 1999, a empresa admitiu ter liberado, ao longo de mais de uma década, milhões de toneladas de rejeitos da exploração de cobre nas bacias hidrográficas dos rios OK Tedi e Fly. O impacto comprometeu 120 comunidades camponesas e de pescadores artesanais na região, afetando até 50 mil pessoas.


Apesar de ter admitido a prática, a empresa continuou a despejar rejeitos tóxicos de mineração nos rios até 2013, quando o governo do país e a comunidade local assumiram o controle das operações da empresa. Os cientistas preveem que levará 300 anos para limpar a contaminação tóxica. 


Diversos acordos foram firmados nos anos mais recentes para tentar encerrar as contestações na justiça contra a BHP, tanto em Papau Nova Guiné, como nos países de origem das empresas e dos acionistas, como por exemplo a Austrália. Mesmo assim, pedidos de responsabilização da empresa continuam surgindo, e observadores internacionais afirmam que a empresa falhou repetidas vezes em reparar os danos causados. 

 

 

Vazamento nuclear na Usina de Chernobil 

Setor econômico: energia nuclear

 

Data: 26 de abril de 1986


Vítimas: estimativas apontam que de 6 mil a 15 mil vidas humanas foram perdidas em decorrência direta e indireta do acidente


O que ocorreu: um acidente com o reator nuclear nº 4 da Usina Nuclear de Chernobil, perto da cidade de Pripyat, no norte da Ucrânia, então parte da União Soviética. 

 

Desdobramentos: Durante um teste, operadores da usina infringiram protocolos de segurança e o reator ficou sobrecarregado. Apesar das tentativas para desligar o reator, outra sobrecarga provocou uma reação em cadeia de explosões em seu interior. Por fim, o núcleo do reator ficou exposto, lançando material radiativo na atmosfera. Ninguém nas imediações foi evacuado nas primeiras 36 horas após o início do desastre, numa tentativa de abafar o problema, o que amplificou o número de vítimas do desastre. 


Ao final, 200 mil pessoas foram deslocadas em razão do acidente. O número de vítimas fatais varia porque muitas contraíram diferentes tipos de câncer decorrente da radiação nuclear e faleceram em épocas e condições distintas. Médicos que pesquisaram as pessoas deslocadas de suas casas relatam que a mortalidade entre os evacuados tem aumentado gradualmente, atingindo um pico entre 2008 e 2012, com 18 mortes por 1.000 pessoas.

 

Autoridades ucranianas estimam que cerca de 5 milhões de cidadãos da antiga União Soviética, incluindo 3 milhões na Ucrânia, tenham sido afetados pelo desastre de Chernobil. Em Belarus, outras 800 mil pessoas também foram atingidas pela radiação e o país perdeu 20% de suas terras agricultáveis. Atualmente, o governo ucraniano paga pensões a 36.525 viúvas de homens que são considerados vítimas do acidente de Chernobyl.


O que resta do reator agora está fechado em uma enorme estrutura de contenção feita em aço e implantada no fim de 2016. As tentativas de contenção e monitoramento persistem e a estimativa é que as operações de descontaminação perdurem até pelo menos 2065. Estima-se que em quase 30 anos o desastre tenha causado 700 bilhões de dólares em prejuízos. 

 

Preservar é coisa de criança!


Desabamento do edifício Rana Plaza, em Bangladesh

Setor econômico: moda 

 

Data: 24/04/2013


Vítimas: 1135 vidas humanas, aproximadamente 2500 trabalhadores feridos 


O que ocorreu: uma inspeção verificou que um edifício que abrigava oficinas de costura tinha fissuras e precisava ser lacrado. Os proprietários desobedeceram a fiscalização, e o prédio desabou com milhares de pessoas dentro um dia após a interdição. 

 

Desdobramentos: não existe uma indenização garantida pelo Estado ou tratamento médico para os sobreviventes em Bangladesh. Dois anos depois, um fundo foi criado junto à Organização Internacional do Trabalho para juntar 30 milhões de dólares e indenizar as vítimas, uma compensação considerada extremamente baixa. Mesmo assim, apenas uma parte das empresas que tinham produções no Rana Plaza contribuiu para esse montante, já que as doações eram voluntárias. Esse foi o maior acidente industrial de Bamngladesh e um dos maiores acidentes de trabalho do mundo. O dono do edifício e mais sete pessoas foram presas.


A tragédia explicitou que a moda é um dos segmentos econômicos menos sustentáveis do planeta. Algumas tentativas de modernizar o setor foram feitas, mas em Bangladesh, das 4500 mil oficinas de costura do país, apenas 1600 aderiram ao Acordo de Bagladesh que obriga empresas têxteis nacionais e internacionais que produzem no país a se submeterem a controles regulares da segurança e da estrutura anti-incêndio. Nenhuma das marcas cujos produtos eram feitos no Rana Plaza foi punida de nenhuma forma

 


Desastre de Bhopal, India 

Setor econômico: agroquímico

 

Data: 3 de dezembro de 1984


Vítimas: o número oficial de vidas humanas perdidas logo após o acidente foi de 2.259. Mais de 500 mil pessoas foram contaminadas. Outras estimativas apontam que 8 mil pessoas morreram uma semana após o acidente e mais 8 mil pessoas nos anos seguintes em decorrência da inalação de gás tóxico durante a catástrofe. O governo da Índia reconheceu que quase 4 mil pessoas ficaram incapacitadas em decorrência da tragédia. 


O que ocorreu: um vazamento do gás isocianato de metila (MIC), uma substância altamente tóxica, teve início na fábrica de agrotóxicos Union Carbide India Limited (UCIL) em Bhopal, Madia Pradexe, Índia, atingindo várias pequenas cidades localizadas ao redor da fábrica. É considerado o pior desastre industrial da história.

 

Desdobramentos: Logo após o vazamento, a fábrica foi fechada para estrangeiros, numa tentativa desesperada do governo indiano de abafar o desastre, o que só gerou mais confusão. O sistema de saúde local entrou imediatamente em colapso e as equipes médicas não sabiam e não tiveram orientação para lidar com os pacientes vítimas do gás tóxico. Houve funerais e cremações em massa. Centenas de milhares de animais de criação morreram na hora ou ficaram doentes e tiveram que ser sacrificados, e áreas agricultáveis ficaram estéreis. 


Em junho de 2010, sete ex-funcionários, incluindo o ex-presidente da UCIL, Warren Anderson, foram condenados a dois anos de prisão e uma multa de 2.000 dólares cada. Um oitavo ex-funcionário também foi condenado, mas morreu antes do julgamento. Muitas vítimas ainda pleiteiam indenização pelos enormes danos sofridos em decorrência do acidente. 

 

Sustentabilidade começa com pequenas atitudes em casa

 

Contaminação por Césio-137, Goiânia (GO)

Setor econômico: energia nuclear

 

Data: 13/09/1987


Vítimas: 66 vidas humanas perdidas e mais de 1400 contaminados


O que ocorreu: um equipamento de medicina nuclear foi descartado de maneira irregular pelo então Instituto Goiano de Radioterapia. Funcionários de um ferro velho se contaminaram ao tentar desmontar o equipamento para aproveitamento das peças. 

 

Desdobramentos: o acidente com Césio-137 foi o maior acidente radioativo do Brasil e o maior do mundo ocorrido fora das usinas nucleares. Além das pessoas que tiveram contato direto com o material, médicos, enfermeiros, bombeiros e policiais militares sentiram os efeitos da radiação. Muitos deles trabalhavam para o Consórcio Rodoviário Intermunicipal (Crisa) e para a construtora Andrade Gutierrez e ficaram doentes ao integrar as equipes de segurança, de descontaminação e de remoção dos rejeitos.


Ainda hoje, muitas dessas pessoas lutam na Justiça pelo direito de receber indenizações, pensões, medicamentos e assistência médica. Alguns sofrem sequelas da exposição nuclear, como tumores, doenças crônicas e feridas que insistem em não cicatrizar. Atualmente, 751 pessoas recebem pensões relacionadas à contaminação pelo Césio-137.


No ano de 1996, a Justiça julgou e condenou por homicídio culposo (quando não há intenção de matar) três sócios e funcionários do antigo Instituto Goiano de Radioterapia a três anos e dois meses de prisão. A pena foi substituída por prestação de serviços.

 

*Cinthia Leone é jornalista da agência O Mundo que Queremos

 

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