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Texto por, Josélia Pegorim - meteorologista da Climatempo
Maio de 2024 será lembrado pela situação de completa calamidade no Rio Grande do Sul, provocada por chuvas extremas e pelo calor completamente atípico no Sudeste e no Centro-Oeste. Os dois eventos podem ser considerados históricos e causados pelo mesmo fenômeno meteorológico: um forte e longo bloqueio atmosférico.
Um bloqueio atmosférico é uma combinação de circulação de ventos em diferentes níveis da atmosfera. Mas quando os vários sistemas meteorológicos causadores destes ventos ficam estacionados por muitos dias, numa mesma posição, as massas de ar não conseguem se mover livremente. O ar frio e o ar quente ficam parados nos mesmos lugares, não se misturam, como deveria ocorrer.
Foto: Imagem realizada pelo Grupo Bandeirantes de Comunicação
Não é a primeira e nem será a última vez que acontecem bloqueios fortes como se observa em abril e em maio de 2024. Num passado não muito distante, em 2020, o Brasil viveu onda de calor histórica de primavera que quebrou recordes de calor de 100 anos. Outro bloqueio memorável para os meteorologistas no Brasil foi o de outubro de 2015.
Mas o bloqueio de outono de 2024 trouxe um elemento novo e preocupante: a temperatura acima do normal do oceano Atlântico Tropical. Este calor está ajudando a manter a situação de bloqueio atmosférico.
O infográfico abaixo mostra os diversos elementos atmosféricos desta situação de bloqueio:
Bloqueio atmosférico - onda de calor e chuva no RS
Quando a chuva no RS vai parar? Quando o calorão vai embora?
A resposta para as duas perguntas é uma só: quando o bloqueio atmosférico for rompido.
Tecnicamente este bloqueio começou no dia 22 de abril. Até o dia 7 de maio, já são 16 dias consecutivos de atuação e a previsão da Climatempo é que se prolongue até o dia 14 de maio. Depois, espera-se que o bloqueio enfraqueça (ou até se desfaça de vez), permitindo que as frentes frias façam o seu caminho natural: passem pelo Rio Grande do Sul e sobre os demais estados da Região Sul e depois sigam para o Sudeste. As mais intensas, conseguem influenciar até o Centro-Oeste.
Em geral, bloqueios muito fortes como este que estamos tendo são enfraquecidos ou rompidos por mais de uma frente fria. É como se a primeira desse umas “marretadas no paredão do bloqueio dos ventos” e a segunda “entrasse com as britadeiras de grande porte”.
Maio é um mês em que já é muito comum termos grandes e fortes frentes frias que conseguem levar um pouco de chuva e ar polar para o interior do Brasil, proporcionando dias bastante frios até em estados como Acre, Rondônia e Mato Grosso, e também em áreas do norte de Minas Gerais e Espírito Santo.
As massas de ar frio de origem polar que saíram da Antártica e entraram na América do Sul neste início de maio tiveram força para esfriar apenas o centro-sul da Argentina.
Uma frente fria passa pelo Rio Grande do Sul nesta quarta-feira, 8 de maio, e, na próxima quinta-feira, 9, o ar frio polar que vem com esta frente fria vai esfriar o Uruguai e até o Rio Grande do Sul. Áreas no sul gaúcho devem amanhecer com temperaturas um pouco abaixo de 10 °C.
No próximo fim de semana, 11 e 12 de maio, uma segunda frente fria deve chegar ao Brasil e ao norte da Argentina com mais força. É esta frente fria que deve dar as primeiras “marretadas” no bloqueio atmosférico, começando a abrir o caminho para outras frentes frias.
A massa de ar polar que vem com esta segunda frente fria deve entrar forte no Sul do Brasil, gelando os três estados e mantendo as nuvens carregadas afastadas do Rio Grande do Sul por dois ou três dias. Deve esfriar até o Mato Grosso do Sul e áreas ao sul e oeste de Mato Grosso. O ar frio vai chegar em parte do Sudeste e baixar a temperatura.
Vai parar de chover no Rio Grande do Sul?
No decorrer da segunda quinzena de maio, com a expectativa de enfraquecimento do bloqueio atmosférico, e até rompimento efetivo, o Rio Grande do Sul terá vários períodos com predomínio de sol, frio e sem chuva. Mas outras frentes frias vão passar pelo estado, só não ficarão paradas por lá. Assim, ainda teremos eventos de chuva até o fim do mês, intercalados com os dias de sol e frio, mas que não trarão chuva tão persistente e volumosa como se observa desde o fim de abril e na primeira semana de maio de 2024.
Mas só pela chuva extrema e a situação de total calamidade destes últimos dias no Rio Grande do Sul, maio de 2024 já se tornou um mês histórico para o clima do estado, do Brasil e da América do Sul.
Inverno e primavera com La Niña
O Rio Grande do Sul teve eventos de chuva catastróficos no inverno e na primavera de 2023 relacionados com as alterações atmosféricas causadas por um episódio muito forte de um fenômeno El Niño. Foram chuvas extremas que deixaram grande parte do estado sob as águas.
Um efeito clássico e esperado do El Niño no Brasil é a chuva intensa sobre o Rio Grande do Sul.
O El Niño 2023/2024 está chegando ao fim e o que se espera para o inverno e a primavera de 2024 é o fenômeno oposto, um La Niña. Um dos impactos comuns do La Niña no Brasil é causar seca no Rio Grande do Sul. Foi o que o estado sentiu em três anos consecutivos de um La Niña incomum, pois se estendeu por três anos, de 2020 a 2023.